domingo, 23 de outubro de 2011

Churidars, spicies e tuk-tuks




Desculpem pelos dias sem novidades indianas. Tivemos um problema com a internet que ainda não foi resolvido. Envio este post de um computador da escola agora que sei como funciona o uso do equipamento de laboratório por aqui. Se me perdoarem, ganham (pra variar) um post enoooooooooorme. Vou tentar escrever posts menores e mais pontuais, mas só tentar. Quando os dedos começam eles não param!

O método de ensino da escola é um tanto um quanto tradicional, coloquemos assim. Não pude ainda me aprofundar  na real filosofia por trás das aulas e, por meu pedido, estou apenas observando as aulas e, vez ou outra, apresentando uma apresentação de Power point sobre o Brasil. O que venho percebendo é que, se por um lado as crianças dessa escola recebem mais do que qualquer outra no Brasil, é na liberdade de expressão que elas perdem. Por mais que todos sejam constantemente estimulados por frases e pôsteres colados por toda a escola, é dentro da sala de aula que os professores não conseguem esconder a vontade de que todos sejam padronizados. Há regras bastante explícitas de conduta e, caso elas sejam quebradas, os castigos podem variar entre humilhação (como permanecer em pé durante toda a aula), receber um tapa ou um bom puxão de orelha ou, em último caso, ser mandado para casa com uma advertência. Minha experiência com escolas (que não de idiomas) é quase nula, mas sei que não é bem assim no Brasil. As carteiras são organizadas de modo que um grupo de alunos seja formado, cada aluno ficando de frente para o outro. Para olhar para o professor é necessário virar-se para o lado.  Se o sistema de ensino favorecesse o trabalho em grupo e a ajuda mútua, essa formação seria ideal. Mas com aulas expositivas, é tentador demais não conversar com quem está do lado ou na sua frente – e eles conversam. Eu nunca vi professores gritarem tão alto, nunca vi tanto medo nos olhos das crianças e, mesmo assim, nunca vi tanta indisciplina. Mais uma vez reforço, não estudei à fundo como as coisas se dão por aqui, não sei a teoria por trás disso tudo, não sei que tipo de educação as crianças recebem em casa. São apenas minhas primeiras impressões.

Há basicamente dois tipos de roupas femininas por aqui: as camisas longas com cortes laterais, usadas com leggings apertadas ou com calças bem frouxas chamadas Churidars (como a foto do post) e os sarees (sempre de sandalia baixa, salto so em ocasioes muito especiais). O saree é um corte de tecido de cerca de dois metros de comprimento que é enrolado de uma forma toda especial ao redor do corpo da mulher. Ele é usado com um top que cobre os ombros e quatro dedos do braço. A maioria das mulheres usam Sarees nas ruas, quando não, as camisas com cortes laterais. Embora seja inapropriado para o ambiente de trabalho mostrar os ombros, os braços e as pernas, nada é dito acerca da barriga. Muitos Sarres chegam a mostrar grandes pedaços da barriga, mas isso não é visto como algo sexy. Diferente, não é? Lembro-me claramente de uma das primeiras lições que aprendi no Brasil sobre o tamanho das blusas que os professores devem usar quando dão aula: se você levantar o braço e sua barriga aparecer, a blusa está curta demais.

Uma das primeiras recomendações de quando cheguei aqui foi cobrir-me. Por um tempo, pensei que era da cultura preservar o corpo da mulher apenas para a intimidade e, por isso, deixei para comprar as roupas que usaria na escola por aqui, após entender como funciona o sistema. A verdade é que o homem indiano é absolutamente tarado. Uma volta pelo centro mostra o porquê de tanto pano em volta das mulheres. Tomei um tuk-tuk para o centro da cidade e, como esse veículo é em geral dividido ( a não ser que você pague o valor de todos os passageiros que o motorista poderia ter pego durante a viagem), um rapaz juntou-se à nossa apertada jornada. Eu estava usando um vestido (vestido no Brasil, aqui, blusa) com uma legging. O vestido cobria os ombros, mas, como estava bem quente, puxei as mangas para baixo, deixando os ombros à mostra. O rapaz não conseguia tirar os olhos dos meus ombros e eu nada entendia. Antes de descer, ele nos perguntou de onde éramos e respondemos “Brazil’. Logo ele suspirou, apontou pros meus ombros e disse com um sorriso imenso: “that’s Brazilian style, right?”. Eu estava completamente coberta e já bastante incomodada por ter que usar uma calça com uma roupa que eu geralmente uso como peça única. Tal comentário foi tão chocante que eu mantive o vestido em “Indian style”. Na rua, os homens agressivamente “secam” as mulheres, especialmente as estrangeiras. E se eu ousar vestir uma blusa com um decote discreto, tenho que agüentar rapazes em motocicletas se erguendo para ver se conseguem ver qualquer resquício de seio. Para o Val está sendo absolutamente irritante. Mesmo que eu me cubra da cabeça aos pés, haverá uma fila infindável de homens pensando coisas bem sujas a meu respeito. Diante desse comportamento, é justificável que o Tuk Tuk tenha um lado reservado para mulheres. Não é apenas uma questão de sexismo, é, muitas vezes, uma questão de segurança.
Outro aspecto interessante são os elogios. Elogios entre mulheres chegam a ser cansativos. Com as unhas horríveis após dias e dias de viagem e adequação, resolvi ir ao salão de beleza do meu condomínio para manicure e pedicure. Tais serviços não só foram bem além do que eu esperava (é dado um verdadeiro tratamento de SPA aos pés e pernas, mãos e braços, com direito a massagem, esfoliação e banho de cremes, um mais cheiroso que o outro).  A manicure em si, o pintar das unhas é frustrante – elas pintam as unhas bem pior do que eu e bem longe do que a manicure mais mal treinada no Brasil faria, até porque a acetona daqui é a pior do mundo. Mas, o que me impressionou foi que, durante todo o tratamento de beleza, a manicure me cobriu de todos os tipos de elogios desde “os seu braços são delicadamente desenhados” , passando por “seus tornozelos são lindamente torneados” até “a cor do seu cabelo combina perfeitamente com você”. Você primeiro fica envergonhada, depois se cansa de agradecer e depois começa a te incomodar. Pode parecer esnobe de minha parte, mas tudo o que eu queria era que ela ficasse calada por cinco minutos ou falasse sobre qualquer outro assunto que não minhas “qualidades”. Vocês podem dizer “Ah, ela estava prestando um serviço”, mas na escola não é diferente. As crianças, as colegas de trabalho...a cultura do elogio é muito forte por aqui. Ser e estar bonita é um elogio enorme para as mulheres, mesmo as nada fúteis. Não há como não pegar a mania para si e soltar um “Good morning, how beautiful you look today!” plenamente involuntário.

Já se vai mais de uma semana aqui e chego a uma conclusão mais ou menos definitiva; a Índia é o lugar do exagero. Tanto as coisas boas como as ruins vêm em porções generosas, sejam as pimentas do prato (certos temperos levam até 50 tipos de pimentas diferentes), seja a sujeira nas ruas, seja o trânsito caótico, a pobreza dos mendigos nas ruas, as cores das decorações, o adorno das roupas das mulheres e crianças e especialmente a gentileza das pessoas. Esse ultimo aspecto e na verdade o mais chocante. Nao importa se voce eh daqui ou estrangeiro, as pessoas estao sempre dispostas a te dar uma informacao, te ajudar em alguma coisa e ate dar caronas. A gentileza entre os condominos do condominio em que moro eh assustadora. Eles sempre estao dispostos a dar uma carona, ajudar na compra de algum item local e estao sempre dispostos a conversar, principalmente se for sobre o pais deles e para saber curiosidades do Ocidente. Essa gentileza muitas vezes pode nao ser vista de inicio. Fechados, raramente ouco gargalhadas pela escola ou pelo predio e quando as ouco, sem que sao as roomates chegando. Estrangeiros sao bem vistos, especialmente pelas castas mais baixas. Como nao sabemos diferencia-los, cumprimentamos a todos como iguais e quem nao gosta de ser tratado bem? Ainda nao entendi muito bem como funciona o sistema de castas, se ele eh assim tao cruel e como se da o tratamento entre uma casta e outra, mas assim que eu tiver informacoes seguras, trago para voces, caros leitores. O que sei eh que, como a pobreza eh grande e ha muitas pessoas na India, ha ocupacoes para coisas que, aos nossos olhos, sao desnecessarias. No meu predio, por exemplo, ha uma moca que limpa a casa, um rapaz de recolhe o lixo e, pasmem, o Iron man, um rapaz que vai uma vez por semana ao nosso apartamento engomar as roupas. Todos esses servicos que, para mim, sao luxos desnecessarios, sao comuns e bem aceitos por todos daqui. A faxineira entra todos os dias as 5 horas e quase invisivelmente limpa a casa. Ela nao faz um sequer barulho. Entra de cabeca baixa e sai de cabeca baixa. Descalca, sequer ouco-a caminhar pela casa. Ela passa invisivel por todos no condominio e foi com surpresa e um sorriso imenso faltando varios dentes que ela respondeu ao meu "Good morning!". A sensacao que eu tive eh que aquele era o primeiro bom dia que ela recebia em decadas. Nao da para nao sentir-se mal diante de uma exclusao social tao grande. Entendam, nao eh que tal exclusao nao exista no Brasil, mas em meu pais nao eh tao gritante. Vejo em muitas `madames' Brasileiras o mesmo comportamento que vejo aqui, mas, felizmente, eh mais incomum.


Dia após dia, vou conhecendo um pouco mais daqui e tanto amando e odiando e amando de novo. Espero por perguntas, dúvidas e sugestões. Um abraço a todos!

Ps: Perdoem a falta de acentos, o post foi escrito metade no meu computador e a outra metade do computador da escola, sem acentos.



10 comentários:

  1. Ta massa o post ;D
    Que tenso isso com as pessoas :/

    divirtam-se people. tem que rolar esse skype qnd voltar a internet.

    por aqui tudo bem. abraço pra ti e pro Vdrz

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  2. Estava com saudade dos seus post.
    Qur bom que aos poucos vcs estão se adaptando.
    Fiquei muito triste com essa história da exclusão social, e entendo que temos isso aqui no Brasil também, mas as proporções aí devem ser maiores inclusive por conta dessa questão das castas.
    Que horror essa taradice dos homens daí, não é a toa que o livro do sexo foi feito aí, o povo gosta mesmo! hehehehe
    Continue nos fazendo aprender mais sobre tudo aí!

    Abraço!

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  3. Alyne, querida, a net voltou. Vai rolar skype sempre!

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  4. Obrigada, Ana Paula!
    É, temos que nos adaptar. É complicado, mas está sendo fascinante!
    Abraço!

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  5. Realmente a pobreza ai é maior e sem maquiagem, como tem muito aqui no Brasil.
    Adorei receber noticias de voces pelo post, mas me deixou um pouco angustiada ele =/
    Mas eu sinto que voces estão conseguindo se confortar um no outro ai, e isso é muito importante!
    No mais, aguardando mais noticias e diferenças entre essas duas culturas tão diferentes!

    Abração!

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  6. Pois é as coisas aqui são realmente muito intensas, a Jamie tem razão. Seja para as coisas boas (cores, incensos), como para as ruins (pobreza, mal cheiro) É diariamente chocante viver aqui, temos sempre que nos adaptar a algo, que de tão diferente, chega a incomodar a princípio.
    Mas é isso mesmo Sara Ortins, estamos nos apoiando, a Jamie me ajuda nos desesperos com minha não comunicação no inglês e eu tento mostrar que ela fica linda com as roupas folgadas que ela diz que não valorizam o corpo dela, mas não é verdade.

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  7. O Saree valoriza, mas a sensacao de ir pra escola de pijama com os churidars eh constante. Eu nunca fui trabalhar de havaiana na vida, esta sendo bem novo pra mim :) e voce eh um fofo, meu amor:)

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  8. Jamie, muito bom ter essa sua visão da Índia. Para mim, a Índia ainda é muito misteriosa por que não sei muita coisa sobre ela, a não ser aquelas poucas informações que aprendi na escola ou na tentativa de uma novela em passar costumes das Índia. A sua visão é de quem está vivendo aí e fazendo o que eu faço: ensinando inglês (embora até esse post você ainda esteja só observando). Sabe, ao ler esse seu post eu fiquei com uma vontade enorme de ir à Índia. Essas especificidades culturais me atraem muito, mesmo que sejam costumes ou relações que aqui no Brasil sejam impensáveis. As relações entre alunos e entre professor-aluno que você mencionou me deixaram curioso para assistir uma aula na Índia. Talvez até para buscar entender um pouco de como realmente ocorrem essas relações: tu já tentou conversar com algum professor para saber dele o porquê dessas atitudes rudes (aos nossos olhos) com os alunos? O que eles dizem? Será que você tem essa liberdade de conversar isso com eles? Pode-se ver a eficácia do ensino de Língua Inglesa na Escola? O Inglês aí é ensinado como Segunda Língua, já que eles falam Inglês no dia a dia não é? Espero ler mais sobre o ensino de línguas por aí. ^^ Sucesso para você e para o Val!!
    Iury Paz

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  9. Iury, dê uma passadinha por aqui no seu intercâmbio, é fascinante.
    Quanto às suas perguntas, conversei com os professores sim e eles foram ensinados dessa forma, portanto, reproduzem. Vou te dar um exemplo: os alunos daqui amam matemática, pois ela é lógica e preto-no-branco. A forma como eles aprendem é assim também. É como se os alunos precisassem dessa rigidez e dessa disciplina exagerada.
    Se funciona, funciona sim. A escola inteira fala Inglês e a língua materna de todos ou é Telugo ou Hindi e eles falam as duas, além do Inglês. A pronúncia é estranha, o vocabulário é bem arcaico, mas é Inglês, e melhor falado que qualquer aluno da melhor escolinha de Inglês. Imagina você receber toda a educação da escola em Inglês? Eu to responsável pelo laboratório de Inglês - para lá são enviados os alunos com dificuldades. É uma nova experiência melhorar a pronúncia de alguém que já tem fluência. Prometo um post só sobre a educação daqui. Obrigada pela visita, pelo comentário e volte sempre.:)

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  10. I LIKED THIS BLOG
    I´M GOING TO INDIA TO BE MISSIONARY
    I´M ENGLISH TEACHER

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